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1966 |
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De
faixa, o time campeão
carioca: Mário Tito,
Ubirajara, Luís Alberto,
Ari Clemente, Fidélis
e Jaime. Agachados: Pastinha
(massagista), Paulo Borges,
Cabralzinho, Ladeira, Ocimar
e Aladim. |
Era
o quarto ano da administração
de Euzébio de Andrade. Nos
três últimos, o torcedor
banguense acostumara-se a ter o
melhor time de futebol da cidade,
que nas horas decisivas tropeçava
sempre no Fluminense e perdia o
título que parecia certo.
Em 1963, a derrota para o tricolor
por 3 a 1, na penúltima rodada,
quando ainda lutávamos pelo
primeiro lugar, foi tão cruel
quanto a expulsão de Zózimo
das fileiras banguenses, por ter
o atleta colocado a mão na
bola dentro da área, provocando
um pênalti infantil para o
adversário.
No ano seguinte, 1964, a decisão
do Campeonato Carioca ficou entre
Bangu e Fluminense. No primeiro
jogo da final, o juiz Cláudio
Magalhães ajudou o tricolor
com um pênalti de uma falta
de Mário Tito em Amoroso,
que, na verdade, ocorreu fora da
área. Na segunda partida,
com a sentida ausência do
goleiro Ubirajara, o Bangu perdeu
por 3 a 1, ficando com o vice-campeonato.
E, por fim, em 1965, precisando
desesperadamente de uma vitória
sobre o Fluminense na última
rodada, o Bangu voltou a cair pelo
placar mínimo de 1 a 0, o
que fez com que o Flamengo saboreasse
o título antes mesmo de sua
partida final contra o Botafogo.
Para a nova temporada, o Bangu mantinha
o técnico Zizinho, que alcançara
o vice-campeonato no ano anterior.
Quem não ficaria mais no
clube era o atacante Parada, negociado
com o Botafogo logo no início
do ano.
Em 1966, a primeira partida do ano,
foi um amistoso contra o Bonsucesso
em Moça Bonita. O resultado
foi uma goleada de 7 a 0. A equipe
era composta por: Ubirajara, Fidélis,
Mário Tito, Luis Alberto
e Ari Clemente; Jaime e Roberto
Pinto; Paulo Borges, Cabralzinho,
Manuelzinho e Zé Carlos -
que este fazia sua estréia
depois de ser contratado junto à
Portuguesa.
O desafio inicial da equipe era
participar do Torneio Rio-São
Paulo. O time até que começou
bem, vencendo a Portuguesa de Desportos
em São Januário no
dia 12 de fevereiro, mas depois
desandou. Perdeu seguidamente para
Corinthians e Vasco, ambos por 1
a 0. Conseguiu vencer o Palmeiras
por 2 a 0 e voltou a perder de forma
consecutiva para São Paulo,
Santos e Botafogo, afastando-se
de vez da conquista do título.
A equipe acordou apenas nos dois
últimos jogos, quando venceu
o Fluminense e o Flamengo. Terminamos
em oitavo lugar entre os dez participantes,
com 8 pontos ganhos em 9 jogos.
Um péssimo início
de temporada para um time do qual
se esperava muito.
Apesar dos resultados não
serem tão significativos
no primeiro torneio do ano, o Bangu
foi convidado para um amistoso contra
a Seleção Brasileira,
que se preparava para a Copa do
Mundo da Inglaterra. No dia 8 de
maio, em Teresópolis, a torcida
assistiu a uma grande demonstração
de talento da Seleção,
não a Nacional, mas a banguense.
Com uma atuação espetacular,
o Bangu venceu por 1 a 0, gol de
Cabralzinho. O técnico Vicente
Feola, que contava com três
banguenses em seu elenco (Ubirajara
e Paulo Borges na reserva, e Fidélis
como titular da lateral-direita),
assustado com o que viu, resolveu
marcar logo uma revanche.
Três dias após a vitória
banguense, desta vez em em Niterói,
a Seleção Brasileira,
finalmente, conquistou o seu triunfo.
O placar foi 3 a 2, tendo Cabralzinho
e Araras anotado os gols banguenses,
contra dois gols de Gérson
e um de Silva.
Na hora de ir para a Copa do Mundo,
Ubirajara e Paulo Borges acabaram
não sendo convocados por
Feola, enquanto Fidélis seguiu
para a Inglaterra, atuando apenas
na última partida da Seleção
contra Portugal, que marcou a nossa
eliminação após
a derrota por 3 a 1.
Em 1966, Ubirajara fez duas partidas
pela Seleção, Paulo
Borges atuou quatro vezes e Fidélis
honrou as cores nacionais em nove
ocasiões. Além deles,
dois outros atletas do elenco banguense
também já colecionavam
passagens pelo Scratch Nacional:
Mário Tito fizera um jogo
em 1963, e Aladim atuou uma vez
em 1964. Isso sem contar o nosso
treinador Zizinho, que por diversos
anos fora titular absoluto da Seleção.
Depois do Torneio Rio-São
Paulo, mais um jogador banguense
era negociado. Agora seria a vez
de Roberto Pinto, que após
muitos anos comandando o meio-campo
alvirrubro, já não
estava mais nos planos da diretoria.
Antes do início do Campeonato
Carioca, a Federação
instituiu novamente a disputa da
Taça Guanabara. Era, provavelmente,
a última chance de Zizinho
conquistar um título pelo
Bangu. Novamente a equipe não
fez um grande papel. Foram somente
cinco jogos, que resultaram em duas
vitórias, um empate e duas
derrotas. Na última rodada,
o Bangu precisava vencer o Flamengo
para chegar à final. Perdeu
por 2 a 1 e acabou em quarto lugar.
Foi, de fato, a gota d'água
para o técnico Zizinho. Um
dia após a derrota para o
Flamengo, o presidente Euzébio
de Andrade comunicava à diretoria
e à imprensa a demissão
do treinador. Faltavam apenas seis
dias para o início do Campeonato
Carioca e um novo nome tinha que
ser chamado às pressas para
comandar o Bangu. O argentino Alfredo
González se apresentou antes
da estréia contra o Madureira
com a imensa responsabilidade de
dar um título carioca ao
clube após 33 anos.
O argentino González, ex-jogador
do Boca Juniors e do Flamengo, era
um colecionador de títulos:
vencera oito no Rio Grande do Sul,
três em São Paulo,
três em Portugal e mais três
em Pernambuco.
A fórmula do Campeonato Carioca
foi alterada mais uma vez. Se, no
ano anterior, apenas oito equipes
disputaram o torneio, em 1966 as
doze equipes estavam de volta, ainda
que apenas oito se classificassem
para o segundo turno. A equipe que
mais pontos somasse nos dois turnos
seria a campeã. Era a fórmula
encontrada pela Federação
para agradar a todos os clubes e
evitar um excesso de jogos.
O Bangu começou a campanha
de 1966 como que predestinado a
obter o título pelo qual
vinha lutando desde 1963. Iniciou
o campeonato disposto a superar
a sina que o perseguia nesses últimos
anos, quando deixara escapar o título
nos jogos finais.
A equipe - jogadores, técnico
e diretores - irradiava otimismo,
embora nunca deixasse de usar a
humildade de "time pequeno"
como sua principal arma. Um perfeito
entendimento entre atletas e dirigentes
e um time tecnicamente bem preparado,
quase sem falhas, fez o Bangu finalmente
campeão.
Eis a maravilhosa campanha que levou
o Bangu à finalíssima
contra o Flamengo:
O Bangu empreendeu a arrancada para
o título de 66 goleando espetacularmente
o Madureira, em Conselheiro Galvão,
por 5 a 0, numa partida em que foi
sempre superior, em virtude da grande
fragilidade do adversário.
Graças a sua maior categoria
e jogando um futebol rápido
e solto, o Bangu voltou a golear,
desta vez, o São Cristóvão,
também por 5 a 0. Os banguenses
mostraram excelente entrosamento
tático e bom preparo físico,
ao contrário dos alvos, que
se mostraram apáticos e sem
entendimentos mútuos.
Na terceira partida, o time estava
embaralhado e confuso no primeiro
tempo, mas conseguiu acertar as
peças no período final,
goleando o América, por 4
a 1, graças às alterações
feitas no ataque pelo técnico
Alfredo González.
Pela quarta rodada, mesmo sem empenhar-se
totalmente e jogando com um jogador
a mais - Íris do Campo Grande
saiu de campo chorando e com o braço
torcido - o Bangu derrotou o Campo
Grande por 3 a 0, sem apresentar
perfeito entrosamento tático,
porém, garantindo a liderança
ao lado de Fluminense e Vasco.
E o Bangu continuou goleando. A
nova vítima foi o Olaria,
que perdeu de 5 a 0, num jogo assistido
por pouco mais de mil pessoas. O
Olaria resistiu valentemente no
primeiro tempo, mas sucumbiu aos
gols relâmpagos do Bangu no
período final.
A excessiva tranqüilidade e
o próprio desinteresse pelo
jogo quase complicaram a vitória
do Bangu por 2 a 1 sobre a Portuguesa,
pela sexta rodada, que chegou ao
empate de 1 a 1, e só não
conseguiu manter este resultado
em virtude do belo gol assinalado
por Paulo Borges, quando faltavam
apenas quatro minutos para o término
da partida.
No primeiro grande desafio, o estreante
Norberto assinalou aos 36 minutos
do segundo tempo aquele que seria
o gol da vitória do Bangu
sobre o Fluminense e que daria também
a condição de líder
invicto e isolado do campeonato.
O placar não refletiu o que
se passou em campo, pois o Bangu
foi sempre mais objetivo, esbarrando
apenas na boa forma do goleiro Vitório,
que salvou o Fluminense de sofrer
mais gols.
O clássico da oitava rodada
entre Bangu e Vasco terminou com
o empate de 0 a 0. O Bangu teve
mais presença em campo, jogando
certo tecnicamente. O Vasco, por
seu lado, foi um quadro que não
se deixou abater, lutando com garra
do princípio ao fim, justificando
o empate sem gols. O Bangu foi infeliz
em certos lances, quando perdeu
várias oportunidades de gol.
Contra mais um dos grandes, o Bangu
foi dominado e acuado em seu próprio
campo no primeiro tempo, mas reagiu
no período complementar levando
seu time à frente, impondo
seu ritmo de jogo ao Botafogo, porém
sem conseguir alterar o placar de
0 a 0, que persistiu até
o fim. O jogo, de modo geral, foi
equilibrado, fazendo justiça
aos dois times. O momento mais difícil
ocorreu quando Mário Tito
cometeu pênalti em Parada,
aos 26 minutos do 1º tempo.
Gérson cobrou, mas Ubirajara
defendeu. Antes, aos 15 minutos,
o Botafogo já tinha tido
um gol anulado do atacante Zélio,
que estava em impedimento.
Voltando às vitórias
e incentivado pela sua torcida que
sempre pedia "mais um",
o Bangu fez 2 a 0 sobre o Bonsucesso.
Os gols foram feitos por Cabralzinho,
aos 4 e 16 minutos do 1º tempo.
Daí em diante, o Bangu preferiu
trocar passes, sem ameaçar
o Bonsucesso que, confuso, se defendia
de qualquer forma. No final, o jogo
terminou monótono.
O Bangu perdeu o 1º turno para
o Flamengo, que continuou invicto,
quando tinha a vantagem de um ponto,
em partida dramática, por
2 a 1. Almir tornou-se o herói
da partida marcando um gol sensacional,
arrastando-se no chão e empurrando
a bola para o gol, criando uma polêmica
entre os torcedores, pois muitos
afirmaram ter sido com a mão.
O outro gol coube a Silva, empatando,
após o Bangu ter a vantagem
de um gol durante o maior tempo
do jogo.
Na estréia do returno, um
gol de meia-bicicleta de Paulo Borges,
aos 30 minutos do 1º tempo
acabou com a apreensão da
torcida banguense contra o Bonsucesso.
No 2º tempo, mais três
gols deram tranqüilidade total
ao time do Bangu, que acabou goleando
o Bonsucesso por 4 a 0.
Pela segunda rodada, um gol de Ladeira,
feito de bico, aproveitando um excelente
cruzamento de Aladim, aos 7 minutos
do 1º tempo foi o início
da vitória do Bangu sobre
o Olaria por 3 a 1. Daí em
diante, o quadro banguense, que
não estava bem, melhorou
bastante, passando a dominar amplamente
o seu adversário, que ainda
conseguiu seu gol de honra.
A grande atuação veio
mesmo na terceira rodada. Manga,
ao tomar inesperado gol, num autêntico
frango, numa bola deixada por Dimas
e que Paulo Borges aproveitou para
inaugurar o marcador, aos 33 minutos
do 1º tempo, abriu o caminho
da vitória banguense por
3 a 0 sobre o Botafogo. Nos quinze
minutos finais, o Bangu chegou a
aplicar o conhecido "olé",
para delírio de sua torcida.
A quarta vitória consecutiva
do Bangu - sobre o América
por 3 a 2 - chegou a provocar a
morte de um torcedor americano que
não suportou seu time levar
o terceiro gol. O jogo foi disputado
em verdadeiro clima de guerra, e
culminou com a invasão de
campo pelo diretor Castor de Andrade,
que inconformado com a marcação
de um pênalti cometido por
Cabrita contra seu time, invadiu
o campo de arma na mão. A
turma do "deixa disso"
conseguiu conter Castor. O Bangu
venceu graças a um pênalti
arrumado pelo Sr. Idovan Silva,
aos 45 minutos do 2º tempo,
e cobrado por Cabralzinho. Sinal
que a invasão de campo do
vice-presidente ajudou e muito o
Bangu a vencer.
Em seguida, o Bangu passou tranqüilo
pelo Vasco, vencendo por 3 a 0.
Aliás, o placar não
refletiu a supremacia do vencedor,
que poderia ter goleado. Calmo e
eficiente, o time do Bangu foi assinalando
os gols da vitória sem se
interessar por uma goleada. Até
a torcida vascaína passou
a torcer pelo Bangu, numa mostra
de revolta pela má campanha
do time e simpatia pelo adversário.
O Bangu credenciou-se a disputar
o título máximo da
temporada ao vencer o Fluminense
por 3 a 1, com facilidade e muita
tranqüilidade. Hábil
e talentoso, Cabralzinho comandou
a orquestra de Moça Bonita,
que bem afinada, isto é,
com bom conjunto, não encontrou
dificuldades para vencer o quadro
tricolor. Esta vitória importantíssima
valeu ao Bangu a Taça Semana
da Marinha, oferecida pela Marinha
do Brasil.
A situação antes da
grande final de 1966 apresentava
a seguinte perspectiva: o Bangu
tinha 30 pontos e jogava por um
empate, enquanto que o Flamengo
tinha 29 pontos e a obrigação
de vencer o jogo do dia 18 de dezembro.
|
A
maravilhosa torcida banguense,
comandada por Juarez,
fez a sua parte no dia da
decisão de 1966. |
A
semana que antecedeu o jogo foi
de muita especulação.
Falava-se na falta de sorte do Bangu
nos momentos de decisão,
do "maior peso" da camisa
do Flamengo, mais acostumado com
as glórias. O que se questionava
não era a maior técnica
do time alvirrubro, era como iria
se comportar psicologicamente uma
equipe que perdera três títulos
praticamente ganhos nos três
últimos anos.
Parecia uma luta desleal entre toda
a torcida flamenguista e um único
banguense: Juarez de Oliveira. Este
cearense de 40 anos era o mais fanático
torcedor do alvirrubro. Chegou ao
Rio no início da década
de 40 e na primeira partida de futebol
que foi assistir, entre Fluminense
e Bangu, viu o alvirrubro perder
por 10 a 2. Ao invés de torcer
para o Flu, Juarez se apaixonou
pelo "pequeno" Bangu e
passou a ser o seu maior defensor.
Passou também, a partir daí,
a andar sempre com a camisa do seu
time por baixo do traje social e
saudando a todos com a frase típica:
"Viva o Bangu!".
A camisa do Bangu, o escudo no peito,
a fivela do cinto e as meias alvirrubras
eram seus companheiros inseparáveis.
Ele era inspetor de seguros e, um
dia, o diretor da empresa, Augusto
Frederico Schmidt, torcedor do Botafogo,
chamou-o:
- Juarez, você vai ter que
tirar essa camisa do Bangu. Schmidt
referia-se à camisa do clube
que Juarez usava por baixo da camisa
social. Conversa daqui, conversa
de lá, o diretor fechou a
questão: a camisa ou o emprego.
Juarez ficou com a camisa.
No dia do jogo, Juarez prometia
ao Jornal dos Sports uma passeata
no centro da cidade, na quinta-feira,
dia 22, puxada por dois elefantes
vestidos de tecido vermelho e branco,
caso o Bangu fosse campeão.
Além disso, Juarez afirmava
que ver o seu clube campeão
lhe daria mais prazer do que ver
seu filho formado em medicina ou
direito.
Os preparativos eram gigantescos
e o Jornal dos Sports relatou a
programação completa
dos festejos da torcida banguense
antes do jogo:
"Para incentivar o time, agrupados
do lado direito das tribunas, vão
se reunir baterias de cinco escolas
de samba: Unidos de Padre Miguel,
Mocidade Independente de Padre Miguel,
Unidos de Bangu, Vai Quem Quer e
Relâmpago.
Para o transporte de cerca de 60
mil torcedores do bairro, que tem
240 mil habitantes, foram convocados
oito caminhões da fábrica,
fretados 16 ônibus e um trem
especial da Central.
Para transportar os foguetes, foi
alugado um caminhão. Duas
orquestras foram colocadas de sobreaviso,
afora a banda da Fábrica
Bangu. Também a Administração
Regional de Bangu cedeu 30 homens
para a organização
das festas, inclusive colocando
gambiarras ao longo da Avenida Cônego
de Vasconcelos.
O carnaval em Bangu já está
preparado."
As bilheterias do Maracanã
registraram um público de
143.978 pagantes. No total, mais
de 150 mil pessoas estavam no estádio
para presenciar a decisão
de 1966.
O Flamengo, por precisar da vitória,
começou melhor, apesar da
contusão de Carlos Alberto
logo nos minutos iniciais. Um lance
que poderia ter mudado o destino
do jogo foi a cabeçada de
Silva, mandando a bola no travessão
de Ubirajara, logo aos 16 minutos
do 1º tempo.
Mas,
o Bangu se acalmou e começou
a mostrar sua maior classe, que
o levaria ao título.
Aos 23 minutos de jogo, Aladim driblou
o zagueiro Jaime e tocou para Ocimar
que chutou alto, aproveitando-se
do fato do goleiro Valdomiro estar
um pouco adiantado. Era o primeiro
gol do Bangu.
Quatro minutos depois, era a vez
de Ocimar retribuir o presente para
Aladim, que teve muita calma para
ajeitar a bola e marcar o segundo
gol. Neste momento, ninguém
duvidava que o título de
1966, com menos de meia hora de
jogo, já era do Bangu.
Desesperados e vendo o bicampeonato
fugir, os flamenguistas tentaram
uma tática suicida no segundo
tempo. Avançaram para o ataque
e deixaram a defesa desprotegida,
fazendo uma linha de impedimento
para invalidar os lançamentos
do Bangu. A estratégia do
técnico Renganeschi mostrou-se
ineficaz, pois logo aos três
minutos, Paulo Borges recebeu um
lançamento de Cabralzinho
e chutou forte na saída de
Valdomiro: 3 a 0. Era o 16º
gol dele no campeonato, que o consagrava
como artilheiro máximo do
ano. Estava liquidado o jogo.
A torcida do Bangu começou
logo o seu carnaval. Agitando bandeiras,
lenços brancos e cantou em
coro: "Tá chegando a
hora..." e "É campeão".
O Flamengo, completamente perdido,
teria agora que evitar levar uma
goleada maior. O desespero era visível
e a solução encontrada
para evitar o massacre foi apelar
para a pancadaria. O jornal A Tribuna
explica como foi o conflito mais
famoso da história do Maracanã:
"Aos
26 minutos, Paulo Henrique e Ladeira
trocaram pontapés no meio-campo
e o jogador do Flamengo queixou-se
de ter levado um tapa no rosto.
Almir, nas proximidades, veio correndo
feito um louco e depois de procurar
Ladeira, deu-lhe um soco que pegou
de raspão.
Ladeira correu e Almir saiu atrás,
perseguindo-o. Quando Ladeira passava
perto de Itamar, este pulou com
os dois pés em seu peito,
escorando-o. Ladeira, inteiramente
grogue, caiu ao chão e disse
se aproveitou Almir para chutar
sua cabeça, num bolo de jogadores.
O conflito degenerou-se, com quase
todos os jogadores brigando. A polícia
só entrou em campo para aumentar
a confusão e agredir fotógrafos.
Almir chegou a ir até a margem
do campo e ali fez sinais indecorosos
para a torcida do Bangu. Depois
voltou até o meio de campo
porque não estava expulso.
O juiz já estava decidido
a expulsar apenas Paulo Henrique
e Ladeira, quando Ubirajara foi
até Almir para dizer alguma
coisa e Almir respondeu com um soco
que derrubou o goleiro. Acontece
que o atacante do Flamengo ficou
rodeado por jogadores do Bangu e
apanhou muito de Ubirajara, Luís
Alberto e Ari Clemente, pois só
depois é que chegaram os
seus companheiros.
Almir saiu de campo, mostrando a
camisa. O campo foi invadido por
jornalistas e fotógrafos
e o juiz Aírton Vieira de
Morais deu a partida por encerrada,
pois anunciara ter expulso Almir,
Paulo Henrique, Silva, Valdomiro
e Itamar, pelo Flamengo; e Ubirajara,
Luís Alberto, Ari Clemente
e Ladeira, pelo Bangu."
Ânimos serenados, o Bangu,
de Euzébio de Andrade, desfilou
tranqüilamente pelo gramado,
diante da frustração
de 100 mil rubro-negros.
Almir foi acusado de ter jogado
dopado. Ventilou-se a anulação
da partida e os dirigentes do Flamengo
deixaram no ar a possibilidade dos
banguenses terem comprado juizes
e bandeirinhas ao longo do campeonato.
O exame antidoping inocentou Almir;
o presidente da FCF, Antônio
do Passo, afastou qualquer hipótese
de se realizar um novo jogo, e as
insinuações jamais
ficaram comprovadas. O título,
depois de 33 anos, era novamente
do Bangu.
|
Capa
da revista comemorativa
da conquista do Campeonato
Carioca de 1966 pelo Bangu. |
A
festa da vitória
"Um,
dois, três,
se não
foge cai de
seis"
- esse o cântico,
misto de alegria
e sadismo
da população
de Bangu,
que tomou
literalmente
a Avenida
Cônego
Vasconcelos,
desde a estação
de trem até
a sede do
clube, onde
duas orquestras
animaram o
carnaval da
vitória.
O cortejo,
que partiu
do Maracanã
por volta
das 21 horas,
chegou a Bangu
às
22:30, com
um jogador
em cada carro
conversível.
Do Maracanã
até
o Méier
tudo foi calmo,
com os torcedores
acenando para
os campeões,
mas tudo de
maneira displicente.
Do Méier
para cima,
as manifestações
iam se tornando
mais efusivas.
Quintino,
Cascadura,
Largo do Campinho,
para explodir
em Padre Miguel,
num foguetório
ensurdecedor.
O Bangu conseguia
reunir todas
as simpatias
e, por incrível
que possa
parecer, até
mesmo torcedores
do Flamengo
deixaram de
lado suas
bandeiras,
como foi o
caso de um
senhor, que
declarava
em frente
à sede:
"Eu sou
Flamengo,
mas o Bangu
é do
meu coração,
eu moro aqui,
estou feliz..."
Na rua, quase
todas as escolas
de samba do
local desfilaram,
além
dos blocos
improvisados,
aos cantos
de "Canta,
canta moçada,
que o Almir
não
é de
nada".
Homens, crianças
- até
senhoras idosas
- dançavam
desde a estação
até
o clube, num
trajeto longo.
Se na rua
tudo era alegria,
no salão
da sede e
no ginásio
do Bangu as
manifestações
chegavam às
raias da loucura.
O chope -
centenas de
barris, que
chegavam minuto
a minuto,
de caminhões
que encostavam
na porta dos
fundos - concorria
para aumentar
a euforia.
Duas orquestras
animavam o
grande baile
(uma delas
a famosa banda
carnavalesca
do Bola Preta),
enquanto os
jogadores
foram ao palco
e chamados
um a um pelo
presidente
Euzébio
de Andrade
Silva, diziam
uma ou duas
palavras e
recebiam as
faixas de
campeão.
À certa
altura, o
patrono do
clube, Dr.
Guilherme
da Silveira
Filho beijou
o presidente
e o chefe
da torcida,
Juarez, dizendo:
"Vocês
me deram o
maior Natal
da minha vida".
O vice-presidente
Castor de
Andrade foi
carregado
pelos torcedores,
que lhe jogaram
confetes e
champanhe,
enquanto várias
bandeiras
eram agitadas.
Assim se conta,
em rápidas
pinceladas,
alguns trechos
da festa do
novo campeão
carioca.
A
Tribuna, 19
de dezembro
de 1966
|
|
|
Euzébio
Gonçalves de Andrade Silva
foi presidente do Bangu entre 1963
e 1968, portanto foi no seu período
que o clube se armou e conquistou
o título de campeão
carioca de 1966. Além disso,
durante esses seis anos, o alvirrubro
viveu sua época de ouro,
os melhores anos de sua longa vida
esportiva. Outros elementos também
colaboraram para a conquista deste
título. Numa homenagem toda
especial, publicamos a relação
de todos que ajudaram o Bangu dentro
e fora dos gramados nesta inesquecível
conquista.
|
Euzébio
de Andrade comemora o tão
esperado título junto
com Paulo Borges. |
Diretoria
1966
Patrono:
Dr. Guilherme
da Silveira
Filho.
Grandes
Beneméritos:
Dr. Manoel
Guilherme
da Silveira
e Dr. Joaquim
Guilherme
da Silveira.
Presidente:
Euzébio
Gonçalves
de Andrade
Silva.
Vice-presidentes:
Dr. Castor
Gonçalves
de Andrade
Silva (administrativo),
Leopoldino
Bernando de
Lima (finanças),
João
Baptista dos
Santos (social)
e Márcio
Alves Franco
(esportes
amadores).
Secretários:
José
Vital, Hélio
Vital de Oliveira
e Jacy Marques
Gonçalves.
Tesoureiros:
Ayrton Moreira
da Silva,
Arthur Araújo
e Cássio
Reis Lopes.
Diretores:
Manoel Rodrigues
Moura (patrimônio
histórico),
Araken Gonçalves
Destri (social),
Francisco
Giorno (esportes
profissionais)
e Antenor
Vicente Corrêa
Filho (esportes
amadores).
Conselho
Fiscal:
Elias José
Gaze, Joviniano
Antônio
da Silva e
José
Jorge Leite.
|
|
|
Comissão
Técnica
Departamento
Médico:
Drs. Arnaldo
Santiago Lopes
e Ivon Côrtes
Massagistas:
José
Pinto de Oliveira,
Nilton Dantas
de Farias
e José
Martins de
Carvalho Júnior.
Preparação
física
e técnica:
Alfredo González,
Silas da Silva
e Francisco
José
Brasileiro.
Sapataria:
Aristides
Pereira
Rouparia:
Manoel Rodrigues
e Waldir Belisário
de Morais
Departamento
técnico:
Antônio
Gonçalves
Teixeira e
José
Rodrigues
Cruzeiro.
|
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Atletas
Campeões
Goleiros:
Ubirajara
Gonçalves
Motta
Laterais:
José
Maria Fidélis
dos Santos
João
Batista Faria
(Cabrita)
Ari
Paulino Clemente
da Silva
Zagueiros:
Mário
Tito
Luís
Alberto
Alves Severino
Meio-Campo:
Jaime
Corrêa
Freitas
Ocimar
dos Santos
Dutra
Jair
Silva Santos
Atacantes:
Paulo
Luís
Borges
Carlos Roberto
Ferreira Cabral
(Cabralzinho)
Adaílton
Ladeira
Aladim
Luciano
Ênio
da Rocha Chaves
José
Carlos da
Silva (Zé
Carlos)
Norberto
Roque Safioti
Antônio
Luiz da Costa
(Tonho)
Luís
Moreira da
Silva Filho
(Luisinho
Boiadeiro)
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A
festa da vitória
Amigos,
pergunto ao
Luís
Baiér:
"Quantos
anos tem o
Bangu?"
Retruca o
colega: "O
Bangu é
antigo pra
burro!"
E, realmente,
ainda segundo
o Baiér,
o Bangu é
mais antigo
do que o América.
Tem muita
idade. No
período
que vai do
seu nascimento
até
hoje, outros
pereceram,
ou estão
agonizando,
ou mergulharam
num ocaso
sem esperança.
Cabe então
a pergunta:
E o Bangu?
Eis o que
eu queria
dizer: durante
várias
gerações
ele foi um
mistério
do nosso futebol.
Ninguém
sabia se o
Bangu era
grande, ninguém
sabia se era
pequeno. Talvez
não
fosse nem
uma coisa
nem outra,
isto é,
nem grande,
nem pequeno.
E, por isso,
justamente,
não
era campeão
há
33 anos.
Vejam vocês:
33 anos! Há
sujeitos que
não
vivem tanto.
Do último
campeonato
do Bangu para
cá,
acontecera
o diabo. Pode-se
dizer que
nasceu um
novo mundo.
E imaginem
vocês
se, depois
de 33 anos
de frustração,
ele não
conseguisse
vencer o Flamengo
na finalíssima.
Eu sou um
dos que acreditavam
mais na vitória
rubro-negra.
E explico:
não
basta time
para levantar
um campeonato.
É preciso
algo mais.
Reparem como
os grandes
fazem entre
si o rodízio
do título.
Há
33 anos que
todo mundo
era campeão,
menos o Bangu.
Num jogo decisivo,
importa ser
grande e ser
pequeno. Muitas
vezes o grande
tem pior equipe.
Mas há
uma série
de imponderáveis
que, muitas
vezes, valem
mais do que
o talento.
E eu achava
que o Flamengo
tinha mais
autoridade,
mais tradição,
mais experiência,
mais sabedoria.
Há
o jogo e o
Bangu vence
espetacularmente.
Pergunto:
e por que?
Foi um pequeno
que venceu
um grande?
Não.
Foi um grande
que venceu
um grande.
A verdade
é que,
não
sei quantos
anos depois
do seu nascimento,
eis que o
Bangu se torna
grande. Foi
preciso que,
domingo, ele
tivesse conquistado
o título
para que descobríssemos
a sua nova
dimensão.
Pode parecer
que ele ficou
grande de
repente. Não
é bem
assim. Um
grande clube
não
se improvisa.
Há
todo um processo
imperceptível.
Mas houve
um fato que
devia ser
elucidativo
para o bom
entendedor.
Refiro-me
ao gesto do
Sr. Castor
de Andrade,
invadindo
o campo no
jogo Bangu
x América.
Eu não
fui testemunha
do episódio.
Contam que
o vice-presidente
do Bangu entrou
em campo e
parecia um
Tom Mix.
Um dirigente
de pequeno
clube não
faria isso,
não
teria essa
audácia.
E quando o
Sr. Castor
de Andrade
assumiu essa
atitude, e
lançou
esse desafio,
eu imaginei:
"O Bangu
começou
a ser grande".
A truculência
de um dirigente
define um
clube e, por
vezes, o consagra.
Comecei então
a desconfiar
que o Bangu
amadurecera
para o título.
Foi como grande
clube que
entrou em
campo domingo
passado e
resistiu e
sobreviveu
à pressão
de um estádio
lotado e ululante.
Outro qualquer
teria tremido
e teria amarelado.
Mas o Bangu
já
era grande
e, repito,
era o novo
grande clube
da cidade.
RODRIGUES,
Nelson. Nasceu
um grande
clube. Rio
de Janeiro.
Jornal dos
Sports, 24
de dezembro
de 1966
Obs:
A crônica
de Nelson
Rodrigues,
no Jornal
dos Sports,
vem de encontro
com um texto
escrito por
seu irmão
Mário
Filho, quando
o Bangu perdeu
a final do
campeonato
carioca de
1951 para
o Fluminense.
Na época,
Mário
Filho aclamava
o Bangu como
"o novo
grande do
futebol carioca".
Neste período
de 15 anos,
o Bangu esteve
sempre nas
primeiras
posições
no cenário
esportivo
carioca, além
de conquistar
diversos títulos
internacionais
e em torneios
amistosos
pelo país.
Infelizmente,
o grande jornalista
Mário
Filho, fundador
do Jornal
dos Sports,
morreria em
17 de setembro
de 1966 e
não
veria o Bangu
campeão.
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Estatísticas |
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Jogos |
4.116 |
Vitórias |
1.713 |
Empates |
980 |
Derrotas |
1.423 |
Gols Pró |
7.267 |
Gols Contra |
6.306 |
Saldo de Gols |
961 |
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Artilheiros |
|
Ladislau |
229 |
Moacir Bueno |
202 |
Nívio |
152 |
Menezes |
138 |
Zizinho |
124 |
Luís Carlos |
119 |
Paulo Borges |
109 |
Décio Esteves |
97 |
Arturzinho |
93 |
Marinho |
83 |
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