O melhor do mundo em livro
Domingos da Guia, maior zagueiro brasileiro de todos os tempos, ganha, finalmente, um livro biográfico, cinco anos depois de sua morte. Por ironia, quem conta a história do "Divino" é um autor inglês.
Texto: Carlos Molinari.

Já disseram que o brasileiro não tem memória. A afirmativa pode não ser cem por cento verdadeira, principalmente em se tratando de futebol. Motivo de discussões acaloradas, o esporte mais popular do país é um poço de referências históricas. Ou algum brasileiro consegue esquecer as proezas de Garrincha, de Pelé, ou o sofrimento nos pés de Paolo Rossi, ou ainda, os gols de Zico e Roberto Dinamite? Entretanto, os craques de um período pré-televisão ficam, na maioria das vezes, esquecidos. Zizinho, Leônidas da Silva, Fausto dos Santos, Friedenreich e Domingos da Guia são nomes de peso no nosso futebol, mas marginalizados no atual contexto.
Justamente para relembrar aos próprios brasileiros a importância de Domingos da Guia - considerado pelos especialistas o melhor zagueiro do país em todos os tempos - é que um autor inglês correu atrás e escreveu a biografia de Domingos da Guia, após uma árdua pesquisa de cinco anos. O autor é o britânico Aidan Hamilton - um inglês radicado no Rio de Janeiro - que trocou o cinzento clima londrino pelo sol da Zona Sul carioca. Apaixonado não somente pela cidade, mas pelo futebol, Aidan não é um estreante. Em 2001, lançou o livro "Um jogo inteiramente diferente - Futebol: a maestria brasileira de um legado britânico", que conta a influência dos imigrantes ingleses no início do futebol nacional. A obra, publicada pela Editora Gryffus, é uma excelente referência para quem quer entender os primórdios do esporte no país.
Agora, também pela Editora Gryffus - uma ramificação da Editora Forense -, Aidan está colocando nas livrarias "Domingos da Guia - O Divino Mestre", uma obra de 334 páginas e que demorou cinco anos para ser concluída e é extremamente minuciosa em detalhes, buscando sempre a opinião de atletas que tiveram o prazer de jogar com o craque, de seu filho Ademir da Guia e de cronistas da época que escreviam nos jornais sobre o melhor zagueiro de todos os tempos. Domingos fez carreira entre 1929 e 1949 e é uma lenda viva em todos os clubes pelo qual passou - Bangu, Vasco, Nacional de Montevidéu, Boca Juniors, Flamengo e Corinthians, além de ter participado com destaque da Copa do Mundo de 1938, na França.
O lançamento oficial do livro é neste sábado, dia 16 de abril, ao lado da estátua de Da Guia, em pleno calçadão de Bangu. E o melhor: seu filho, Ademir, estará presente ao evento.
Segundo Aidan Hamilton, "Domingos é um atleta único. Ele foi tricampeão sul-americano em três países diferentes. Em 1933, ganhou o campeonato uruguaio com o Nacional. Em 1934, levantou o Campeonato Carioca com o Vasco.
E em 1935, ajudou o Boca Juniors a se tornar campeão argentino". Esse feito exclusivo é o que levou o pesquisador inglês a se interessar pela carreira de um jogador que ele sequer viu jogar. "Tive alguns contatos com Domingos antes de ele morrer, mas infelizmente ele já não se lembrava mais nada de sua época, por isso tive que reconstituir toda sua história através de uma longa pesquisa em jornais e revistas".
Quem foi Domingos?
Era uma época em que o manual do bom zagueiro recomendava que a bola deveria ser espanada o mais rápido possível das imediações da área. Habilidoso e estilista, Domingos da Guia fazia as coisas a seu modo. Protegia a bola com categoria e saía com ela sem temer os atacantes, driblando os que aparecessem pelo caminho. A ousada jogada era a sua marca registrada e passou a ser conhecida como "domingada".
O jeitão abusado de Domingos encontra explicação na várzea de Bangu, subúrbio do Rio de Janeiro. Desde criança exibia um talento incomum para um becão. Sair driblando em plena área era, então, uma conseqüência natural para alguém como Domingos. A fama de rei das peladas logo o levou para a categoria de base do clube local. Sua primeira partida como jogador profissional, defendendo as cores da equipe principal do Bangu aconteceu em 28 de abril de 1929, contra o Flamengo. O time de Moça Bonita bateu o rubro-negro por 3 x 1. Os dirigentes do Vasco da Gama viram o show e foram mais rápidos, contratando-o. Seu futebol era tão espetacular que, aos 18 anos, ele já estava na Seleção Brasileira. Recebeu propostas de muitos clubes e preferiu o Nacional, do Uruguai. Aos 20 anos, já era chamado de "El Divino Mestre", apelido dado pelos uruguaios. Passou depois por Vasco, Boca Juniors e ganhou três estaduais no Flamengo. O lance mais discutido de sua carreira, no entanto, aconteceu durante as semifinais da Copa do Mundo da França, em 1938. A Seleção perdia por 1 x 0 para a Itália, mas pressionava o adversário em busca do empate. Aos 17 minutos do segundo tempo, veio o golpe fatal. O italiano Piola provocou e Domingos da Guia cometeu um pênalti infantil que custou a eliminação brasileira.
Ficha completa
Nome:
Domingos Antônio da Guia
Nascimento/morte:
Rio de Janeiro, RJ, 19/11/1911 / Rio de Janeiro, RJ, 18/5/2000
Posição:
Zagueiro
Clubes em que jogou:
Bangu (1929 a 1931, 1948 a 1949), Vasco da Gama (1932 e 1934), Nacional-URU (1933), Boca Juniors-ARG (1935 a 1936), Flamengo (1936 a 1943) e Corinthians (1944 a 1947)
Títulos:
Campeão uruguaio (1933) pelo Nacional; carioca (1934) pelo Vasco; argentino (1935) pelo Boca Juniors; carioca (1939, 1942 e 1943) pelo Flamengo.