Bangu não será timinho
Eusébio retoma o comando com força total
Fonte: Jornal Última Hora, 23 de janeiro de 1969
Repórter: Carlos Felippe
- O Bangu não será nunca timinho – é a promessa do presidente Euzébio Andrade Silva, ratificando a sua disposição de continuar no comando do clube “por dois ou mais anos até”, numa prova de reconhecimento ao apoio recebido de seus associados e, principalmente para atender ao apelo formulado pelo seu filho Castor de Andrade.
- Estou disposto a todos os sacrifícios para tornar verdadeiramente o Bangu não somente uma grande equipe, mas sobretudo – e especialmente – um grande clube em todos os sentidos.
De mangas arregaçadas para o trabalho, que considerou de “redenção total”, o presidente Euzébio Andrade Silva já iniciou contatos com o patrono Guilherme da Silveira Filho no sentido de construir a comunidade banguense na Vila Hípica e, paralelamente, está acertando todas as renovações de contrato, iniciadas por Aladim.
- Meu objetivo é dar ao Bangu uma sede à altura do seu prestígio e para mantê-lo assim estou também cuidando de segurar os nossos melhores jogadores. Está decidido, aliás: não vendo jogador julgado indispensável.

Em princípio, “seu” Zizinho mantinha-se arredio à hipótese de sua reeleição, justificando a sua atitude com a necessidade de tratar mais dos seus negócios particulares, do qual já encontrava afastado há quase cinco anos, “desde o primeiro dia em que assumi a presidência do Bangu”.
- Realmente – afirma – larguei tudo para dedicar-me de corpo e alma ao clube, para provar que eu não era somente um corneta e realmente tinha condições de levantar seu prestígio e fazê-lo conquistar inclusive o título da cidade.
Beirando os 73 anos, o presidente Euzébio Andrade Silva revela que “desde 1933 vinha aguardando o Bangu ser novamente campeão”, mas confessa que “em 62 cansei de esperar e resolvi tomar conta do barco”.
- Assumi a presidência em 1963 – diz – e a minha primeira providência foi dispensar quase todo o time do Bangu, a maioria com passe livre. Para arrumar a casa era preciso esvaziá-la – e foi o que fiz. Daí para a frente fui buscar os reforços necessários, entre eles Parada. E contratei Tim, que era parte integrante da minha plataforma de candidato.
Para o presidente Euzébio Andrade Silva, o campeonato de 63 foi “um manancial de experiências”, ressaltando que pôde atestar que o futebol é verdadeiramente uma guerra, por ser uma guerra, todas as armas são válidas – até mesmo as desleais.
- É uma guerra por vezes suja – acentua, acrescentando – nem sempre o campeão é o melhor time. Em 63, o Bangu foi de fato o melhor time mas perdeu o campeonato, após liderá-lo até a antepenúltima rodada. Mas a perda do título valeu-me muito, porque pude aparar certas arestas e prevenir-me para o campeonato imediato.
Só vice
Segundo o presidente Euzébio Andrade Silva, a conservação de uma grande equipe, a descoberta de reforços certos para os lugares certos, a liderança sobre os jogadores dentro e fora de campo “exige muita pertinácia”, enfatizando que os problemas são tantos e diversos que “qualquer covarde foge sem olhar para trás”.
- Mas eu havia prometido a mim mesmo que toparia qualquer parada, em qualquer aspecto, sem olhar tempo e hora, porque meu objetivo era único: tornar o Bangu campeão carioca. E não me importava sequer com o lado financeiro, embora a maior parte das responsabilidades dos contratos de jogadores pertencesse a mim.
Em seu depoimento, “seu” Zizinho garante que o início do campeonato de 64 “foi terrível”, já que a equipe não conseguia armar-se e perdia pontos julgados irrecuperáveis para pequenos clubes. Porém, “uma sacudidela” bastou para que os jogadores entrassem em brios e, sob um novo comando – Martim Francisco – reencontrassem o melhor jogo, conseguindo uma invencibilidade de 17 jogos e chegar às finais com o Fluminense, com quem disputaria a melhor de três.
- A melhor de três – afirma – foi uma outra experiência, mas bastante amarga. A partir da saída de Martim, da escalação dos juízes contra a minha indicação, até à marcação de um pênalti inexistente de Mário Tito em Amoroso, tudo correu de forma a impedir que o Bangu fosse campeão. E mais uma vez tive que aceitar um vice.
Tranqüilo, repetindo alguns adágios populares e, dentre eles, o que assegura ser “do mato baixo que sai o coelho e na toca rasa que se esconde o tatu”, o presidente Euzébio Andrade Silva revela que o novo vice não o desanimou, mas, pelo contrário, deu-lhe mais força e vontade para atingir o seu ideal: o campeonato.
- Realmente parei um pouco para pensar e depois de consultar os meus botões – assegura – decidi: vou pra briga outra vez. Reformulei os planos, contratei novos reforços, arrumei novamente a casa e parti para a guerra. De peito e coração aberto.
Como o time do Bangu estava entrosado, disse que acreditou que pudesse desta vez obter o título e, de fato, a sua trajetória no campeonato foi excelente, mantendo-se na liderança bastante tempo, juntamente com o Flamengo.
- Mas o pior – fala – estava para acontecer: uma derrota inesperada para o Fluminense e um “acerto” para que o Flamengo não perdesse para o Bonsucesso, alijou-nos do título, deixando-nos um ponto atrás do próprio Flamengo. E curti mais um vice.
O título
- Porém – prossegue – esse vice-campeonato deu-me a certeza de que o campeonato não se ganha somente no campo. Certeza esta que reforcei, quando, numa assembléia da FCF, eu não tinha sequer uma cadeira para sentar. E entendi que bom futebol no campo e melhor política na federação eram armas indispensáveis para conquistar qualquer título.
Segundo o presidente Euzébio Andrade Silva, a sua primeira providência para o ano de 66 “foi derrubar o esquema armado na FCF, que distribuía títulos aos clubes privilegiados”, e contratar um treinador simples e objetivo, que tivesse sobretudo a capacidade de simplificar as coisas, “sem inventar nada”.
- Consegui liderar a campanha para a eleição de Otávio Pinto e, assim, afastar o ex-presidente e contratei González, nas minhas cogitações já há muito tempo. E tranqüilizei-me: estava coberto nas duas frentes de luta.
“Seu” Zizinho revela que não tinha maiores problemas com o time banguense, porque “sabia que era realmente um dos melhores da cidade e talvez do próprio Brasil”. Prova disso, era o fato de que se mantinha com a mesma formação há três anos seguidos.
- Nossa equipe – enfatiza – era uma máquina. Além de jogar com rara beleza, era eficientíssima. Sua trajetória no campeonato foi à base de goleada, tendo conseguido nos cinco primeiros jogos marcar 23 gols e sofrer apenas três. Nessa marcha batida, firme, chegamos à final, com um ponto de vantagem sobre o Flamengo.
O presidente banguense faz uma pausa, respira fundo, muda a posição dos óculos e confessa que “o título veio afinal, mas todos viram como o nosso adversário virou a mesa”.
- Todas as vezes que o Bangu saiu de campo derrotado, soube cavalheirescamente cumprimentar o adversário vitorioso. Quando, por fim, conseguimos o título, fomos agredidos e pisoteados de forma selvagem, como se a agressão e a covardia pudessem empanar o brilho da nossa conquista, reconhecida como justa por todos, sem exceção.

Sonho agitado
Empolgado pelo título e, especialmente, “pela certeza da promessa cumprida” o presidente Euzébio Andrade diz que “sonhei com o bi, embora fosse um sonho agitado e difícil”. Mas cuidou de rearmar o time, procurando corrigir pequenas falhas, porque na sua opinião a “guerra seria pior: todos contra o Bangu”.
- Nosso time era bom e, por isso, manteve-se na liderança todo o tempo do campeonato, juntamente com o Botafogo, que surgia como uma grande equipe também. Fomos os dois, par a par, palmilhando o caminho do título, apesar das duras insinuações dos inimigos que, infelizmente, não reconheciam a nossa classe e categoria, evidenciada no campo e à vista de todos.
Para o dirigente alvirrubro a “guerra” do campeonato travou-se em todas as frentes e o Bangu “como o lado mais fraco da corrente” tornou-se a grande vítima, “quando todos o apresentavam como grande beneficiado”.
- Perdemos o bi para o Botafogo, mas ninguém até agora encontrou meios para justificar o gol anulado de Del Vecchio. Porém, embora terrivelmente prejudicado, o Bangu portou-se com dignidade: não virou a mesa e aplaudiu o novo campeão.
Desgaste
Sem referir-me ao campeonato passado, que considerou o “ano das vacas magras, porque o time estava totalmente desgastado”, o presidente Euzébio Andrade Silva lembra, porém, que o Bangu foi o melhor classificado entre os clubes cariocas na Taça de Prata e o segundo na recém-disputada, “embora os grandes problemas que teve na formação do time, com a maioria dos seus jogadores machucados”.
- Já esperava “deblace” – diz, justificando: - qualquer máquina após um certo período de uso constante desgasta-se fatalmente.
Envolvido por inúmeros problemas, o presidente decidiu não aceitar a sua reeleição e a sua atitude provocou inúmeros apelos para que continuasse. Porém, a sua decisão de permanecer, ele próprio explica:
- Alguns maus banguenses, sem sequer importar-se com o drama familiar que vivia, tiraram a máscara e insinuaram que eu iria abandonar o clube, porque esteve à beira da falência. Jamais fugi à luta e decidi continuar, para mostrar que não sou um covarde. E provar que o Bangu não voltará a ser timinho.
Com voz firme, “seu” Zizinho assegura que o Bangu vai outra vez pra cabeça e que ele, pessoalmente, vai dar o maior dos seus esforços para chegar novamente ao título carioca.
- Conto com o Marcos Garcia e o Onésio Silva para me ajudar no futebol, indicados pelo próprio Castor. Com eles trabalharão o Ocimar, confirmado no cargo de treinador, o médico Arnaldo Santiago e o preparador-físico Ari Vieira. Essa é a nossa equipe de comando. Tenho certeza de que não vai falhar, como nunca falhou.
Sobre o time, garante que “vai ficar mais forte ainda” e, para tanto, já iniciou entendimentos para a renovação de todos os contratos encerrados e prometeu que vai trazer rápido novos reforços.
- Vou buscar o Zé Roberto, o Cabralzinho, o Édson, e mais uma novidade e posso garantir que o Bangu vai ficar afiado. Senão aguardem o time: Ubirajara, Fidélis (Cabrita), Mário Tito, Luís Alberto e Pedrinho; Jaime (Édson) e Juarez; Marcos, Zé Roberto, Cabralzinho (Maurício) e Aladim.