Agora é com o Flu
Para ser tri, o Fluminense terá de ganhar do Bangu, que eliminou o Flamengo e só depende de um empate
Fonte: Revista Placar, nº 813, 20/12/1985
Fluminense ou Bangu. Um deles nesta semana será o campeão carioca da atual temporada. Para o Fluminense a decisão representa muito mais que um simples título, já que corre atrás de seu primeiro tricampeonato da era Maracanã. Para o Bangu, representa a alegria de ser mais uma vez o campeão carioca, título que vem perseguindo desde 1966, há 19 anos, portanto. Com essa expectativa, os tricolores iniciaram a semana em agitados preparativos. Enquanto nas Laranjeiras o técnico Nelsinho e o preparador físico Lúcio Novelli tentavam dar força física e tática aos jogadores, nas salas do Maracanã a torcida começava a armazenar pó-de-arroz em centenas de saquinhos plásticos. Eles são atirados no ar no instante em que o time entra em campo carregando uma enorme bandeira verde, branca e vermelha. Além disso, dezenas de rolos de papel e bandeirinhas brancas, que serão distribuídas a diversos setores da torcida, estavam sendo providenciadas. Além, é óbvio, dos fogos de artifício que a torcida consegue passar escondido, pois seu uso é proibido no estádio. “Faremos uma festa de gala”, diziam os chefes de torcidas. Quer dizer, isso se o Bangu deixar que a festa prossiga durante e depois do jogo.
Nelsinho, um atento observador no Maracanã, domingo, quando o Bangu deu um grande passo para o título ao vencer o Flamengo, com méritos, por 2 x 1, optou pelo equilíbrio em suas declarações. Afinal, o Bangu não é apenas um time bem-armado sob a liderança de Moisés. Tem também o craque Marinho, que desequilibrou contra o Flamengo, marcando de cabeça o primeiro gol, aos 17 minutos do segundo tempo, após uma falha de Leandro: perdeu uma bola para Márcio, que cruzou para o ponta-direita cabecear no canto. E tem, ainda, o goleiro Gilmar, uma barreira na frente das pretensões dos rubro-negros, que já planejavam a comemoração do título.
Por sua vez, Nelsinho, que no intervalo do jogo de domingo cantou a vitória do Bangu no segundo tempo, ao ver “o Flamengo cansar e o Bangu se acalmando ao botar a bola no chão”, preferiu não arriscar um palpite. Criticou os contra-ataques do Fluminense no Fla-Flu da quarta-feira da semana passada, apontando a má atuação individual de Tato e Romerito, elogiou a segurança do quarto-zagueiro banguense, o professor de português Oliveira, considerou arriscada a escalação de Perivaldo, há nove meses sem jogar, e, no final, quando já saía do Maracanã, revelou: “Para nós, na decisão com o Bangu, é vencer ou vencer”, um lema utilizado desde a gestão do ex-presidente Francisco Horta, bicampeão em 1975 e 76.
Trocando em miúdos, o técnico tricolor quis dizer que o Fluminense vai à luta, partindo para cima do Bangu, para tentar o gol, “com as devidas cautelas”, já que o empate dá o título ao time de Moça Bonita. Taticamente, ele agiu como o técnico Moisés, mais tarde, no vestiário vitorioso do Bangu: não mencionou o pulo do gato. “O Fluminense é um perigo à frente de nossas pretensões”, dizia Moisés em meio a um sorriso que demonstrava a confiança no grupo de jogadores do Bangu. E completava: “Eles jogaram meio sem ritmo no Fla-Flu da semana passada. Por isso, eu disse às rádios e jornais que o Fluminense era o mais fraco entre os três finalistas. Mas, com os dias que tiveram para se recompor... o Fluminense, pela bagagem que carrega, já diz tudo. Não é à toa que é o bicampeão carioca e foi o campeão brasileiro do ano passado. É um dos melhores times do Brasil. Só posso dizer que vai ser uma decisão maravilhosa. Mas acredito na categoria do Bangu”.
Ao comentar a possibilidade de ser campeão com um empate, nem vacilou: “Vamos nos prevalecer dessa vantagem”. E riu, como se dissesse “não viram como acabamos de despachar o Flamengo?” Todos viram, é claro. Um Bangu arrumadíssimo na defesa, atuando com um bloqueio tão bem-feito que chegou a levar a galera do Flamengo (93.433 pagantes e renda de 1.737.930.000 cruzeiros) à loucura. Claro que o time rubro-negro teve várias oportunidades de gol, instantes em que o goleiro Gilmar fez defesas seguras e importantes, como num chute de Chiquinho, ainda no primeiro tempo. Mas o que aumentou a confiança de Moisés foi a colocação correta e a frieza de sua defesa nos momentos de maior pressão do Flamengo.
Se nas cadeiras especiais e cabines de rádio o técnico Zagalo e o jogador Zico se dividiam, como, aliás, grande parte dos torcedores, entre o sorteio dos grupos da Copa do Mundo, no México, e o jogo (Zagalo considerou o sorteio bom para a Seleção Brasileira, mas disse que o Brasil não tem de ter medo de ninguém, enquanto Zico até preferia um grupo mais forte do que, a princípio, para ser este formado por Espanha, Argélia e Irlanda do Norte), os jogadores do Bangu preferiam falar mesmo é da decisão com o Fluminense. Arturzinho, ainda eufórico com o gol, o segundo do Bangu, um cruzamento de Ado, que escorou de pé direito, aos 21 minutos do segundo tempo, fazendo 2 x 0 (Bebeto descontaria mais tarde para 2 x 1, o marcador final), desabafava: “Que critiquem a mim e a Marinho, como fizeram outro dia. Somos tarimbados e sabemos dar a volta por cima. Mostramos, ele, eu e todos os companheiros, que também sabemos disputar uma decisão”.
Parecia repetir as palavras do patrono Castor de Andrade, o dono do time, ao deixar uma cabine de rádio, formando uma figa com os dedos da mão esquerda: “Meu time mostrou que não é formado por covardes”.