Bangu Atlético Clube: sua história e suas glórias

Neto, o talento na encruzilhada

O polêmico jogador de 20 anos luta para ficar no Bangu, desmente a fama de boêmio e ameaça processar o Guarani

Fonte: Revista Placar nº 865 - 22/12/1986

A bola sai tão macia de seus pés que quase todos o definem como craque. O passe perfeito invariavelmente encontra um companheiro bem colocado e o chute certeiro muitas vezes garante a festa da torcida e o desespero do adversário. Essas qualidades do meia Neto normalmente seriam suficientes para que um clube ousasse pagar os 10 milhões de cruzados que o Guarani pede para cedê-lo definitivamente ao Bangu. Mas o elogiado - e polêmico - Neto sabe que está numa situação difícil. "Quero ficar em Moça Bonita", afirma. "Só que nenhum time do Brasil tem esse dinheiro".

A vontade de permanecer no Bangu é tão forte que faz Neto abandonar a prudência. "Este é o melhor clube do país. Não existe nada igual". O milionário bicheiro Castor de Andrade, no entanto, tem razão quando hesita em investir tanto. "Pelo que mostrei, acho que não serei contratado", reconhece. E até que o patrono da equipe apostou pesado no jogador: não regateou para pagar 1 milhão de cruzados pelo prazer de contar com um talento durante três meses - sem contar o salário de 70.000 cruzados. "A verdade é que não estou dando sorte aqui", diz. "Estamos mal na Copa Brasil e a coisa ficou pior ainda para mim".

Realmente, Neto até agora brilhou em poucos momentos no Bangu. Além da fratura no pé direito, que o obrigou a uma inatividade de 45 dias no início da segunda fase da Copa Brasil, ele enfrenta em sua passagem carioca um velho rival: o excesso de peso que leva muitos a vaticinarem para o jogador o mesmo fim prematuro do fenomenal centroavante Coutinho, parceiro de Pelé no inigualável Santos dos anos 60. "Faço regime, mas não adianta", constata. Os 74kg distribuídos em 1,75m de altura, porém, não incomodam tanto o jovem de 20 anos. "É incrível: acho que rendo mais quando estou gordo", acredita. "Deve ser uma questão psicológica".

Os quilos a mais, de fato, não tiram o sono de Neto. "O pior é carregar essa fama de boêmio", reclama. "Vou uma vez a uma boate e logo dizem que sou freqüentador assíduo". Por causa disso, a família de Ana Helena, de 22 anos, não aceita o namoro dela com Neto. Até hoje, ele só a vê nas raras visitas a Santo Antônio de Posse - cidade paulista onde ambos nasceram - e assim mesmo às escondidas. "Parece coisa do século passado, mas é verdade", conta. "Não querem que Ana se case com um jogador de futebol".

Em Moça Bonita, contudo, a imagem de Neto é diferente. Morando na concentração do clube, ele passa o tempo de uma maneira inimaginável para quem só o conhece de histórias de noitadas regadas a álcool. "Adoro novela. Vejo todas e fico triste quando acabam", confessa meio sem jeito.

Esse comportamento admite algumas variações. "Sou igual às pessoas de minha idade e de vez em quando vou mesmo a bares e boates", declara. "Não posso virar santo só porque sou atleta". Nem tão angelical nem tão louco. Com o dinheiro que ganha, ele sustenta a mãe, dona Maria Aparecida, e três dos quatro irmãos. "Ninguém comenta isso, nem o fato de eu ter três apartamentos em Campinas", revolta-se.

A segurança financeira permite que Neto vislumbre um futuro determinado por ele próprio. "Se o Guarani não vender meu passe, eu mesmo vou comprá-lo", promete. A recusa em voltar ao clube que serviu de passarela para convocações às seleções brasileiras de juvenis, juniores e de novos tem uma explicação. "Desde os 16 anos fui titular lá", recorda. "Mas eles nem tiveram a consideração de me pagar os 15% referentes ao empréstimo ao Bangu".

Neto ameaça ir à Justiça para receber o dinheiro. O Guarani seguramente não terá de volta seu talento. A categoria de um craque de 20 anos está à disposição do Bangu, preferencialmente, ou da equipe que apostar no futuro com a mesma coragem que ele.