Palmieri: um gigante no gol
O Bangu lança um goleiro que surpreende por seu tamanho e personalidade. Com 2,03m, ele está levando atacantes ao desespero.
Fonte: Revista Placar, nº 896, 03/08/1987
Repórter: Alfredo Ogawa
Quando viu aquela muralha debaixo do gol do Bangu, no Maracanã, dia 18, o centroavante Washington, 1,88m, previu problemas para o seu Fluminense. Pouco importava se o goleiro não passava de um júnior, escalado à última hora para substituir o contundido Gilmar. Aquele tal de Palmieri era diferente.
O atacante tinha razão. "Foi uma covardia", recorda, entre risos, o meia do Bangu, Arturzinho, 1,64m. A cada cruzamento, os tricolores se matavam para acertar uma cabeçada. Invariavelmente, porém, a bola ficava nas mãos do comprido Palmieri. Nervoso com tantas jogadas inúteis, Washington explodiu: "Esse homem parece ter 3m de altura". O jogo terminou 1 x 1. Na realidade, ele mede 2m. "Com chuteiras, 2,03m", corrige o goleiro. De qualquer modo, uma medida impressionante. Afinal, não é sempre que aparece alguém que, de braços erguidos, chega a 2,50m e tem a obrigação de defender uma baliza de 2,44m. Como se não bastasse, esse gigante ainda é capaz de alcançar um objeto a 3,50m.
Ser esguio assim pode facilitar no momento de enfrentar bolas altas, mas no dia-a-dia o tamanho provoca dor de cabeça. Do banheiro ao carro, passando por roupas e até o cinema, tudo parece trabalhar contra este jovem Gulliver.
É verdade. Tomar banho no vestiário de Moça Bonita exige dele muito contorcionismo. "Pior ainda é andar no Fiat de meu pai", brinca. Do apoio familiar, contudo, ele não pode se queixar. A casa da família, bem próxima ao estádio, está toda modificada para atender às exigências do filho. Os batentes das portas subiram. E uma cama, muito maior, foi construída.
Aos 18 anos, Roberto Palmieri de Souza, 91kg, encontra problema nas mínimas coisas. Como calça 45, é obrigado a encomendar sapatos especiais. "Chuteiras até que existem do meu tamanho no mercado", explica. No cinema, sempre se senta na última fila para não ouvir queixas.
Quando tinha 11 anos, já ultrapassava a barreira do 1,80m. Ou seja, era 8cm maior que o Zico de hoje. "Por isso as roupas ficavam logo pequenas", lembra a mãe, dona Verônica. "O jeito era empurrá-las para o pai dele".
Com 1,80m, "seu" Romano, funcionário público que quando jovem andou distribuindo botinas na zaga do time aspirante do Bangu, justifica o gigantismo do rebente como um sinal de hereditariedade. "O avô dele, Francisco Romano, media 2,07m", relembra. "E seus quatro irmãos tinham mais de 2m cada um".
Tão grandalhão, não faltaram a Palmieri os inevitáveis convites para jogar basquete, um esporte que, por necessidade, sempre atraiu pessoas altas. Como Oscar, 2,04m, hoje no Juve Caserta, ou Israel, 2,05m, e Marcel, 1,98m, ambos no Alno Fabriano, todos na Itália.
"Eu gostava mesmo era de me atirar atrás de uma bola", conta Palmieri. Por isso, inscrito na escolinha do Bangu, logo se destacou. Não era apenas grande. Exibia uma destreza incomum. Tanto que, desde 1981, quando começou, já colecionou duas convocações para a Seleção Brasileira - como infantil em 1984 e 1985. "Sem contar a participação em três seleções cariocas", observa.
Naturalmente, um corpo desenvolvido tem lá suas vantagens. "Até hoje ninguém se arriscou a brigar comigo", ironiza. E o sucesso entre as garotas é garantido. "O telefone de casa vive ocupado com tantas meninas procurando por ele", revela o pai, com orgulho.
Engana-se quem imagina que Palmieri possa sentir-se deslocado na sociedade por causa de sua altura. "Não sou nenhum grandão bobo", defende-se. A seu favor, ele apresenta os estudos: cursa o primeiro ano da faculdade de Administração de Empresas. E pensa ainda em se dedicar à educação física, ao desenho e à música. Desinibido, não esconde o desejo de se tornar um grande poeta. "Até que tenho jeito", acredita.
Por enquanto, toda a sua atenção está voltada para o duro ofício de jogar na meta. "Preciso acabar com o preconceito de que goleiros altos são ruins em bolas rasteiras", promete. Seu incentivador nesta batalha é Gilmar, 1,81m, o experiente goleiro titular. "Ele tem potencial para ser um dos melhores do Brasil", prevê. O zagueiro Mauro Galvão, 1,79m, concorda: "O garoto é espichado, mas tem uma agilidade incrível".
Outro companheiro, Arturzinho, mostra uma boa razão para apostar no êxito do amigo: a personalidade forte. "Isso é fundamental embaixo do gol", define. E dá o exemplo: no intervalo daquela partida com o Fluminense, que abriu o terceiro turno do Campeonato Carioca, aconteceu a surpresa.
Foi assim. De repente, Palmieri, até então um júnior que curtia sem dramas a reserva, passou simplesmente a dar instruções ao time todo. "Fiquei de boca aberta", confessa Arturzinho. "Só pensei que aquele menino tinha futuro". Um grande futuro, sem dúvida.